terça-feira, maio 25, 2010


"O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há,estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje.Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida,o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. "

by Miguel Esteves Cardoso

3 comentários:

Anónimo disse...

Um texto com muita pertinência e muita verdade, deixa-me a sorrir por a verdade ter alguém que me enche de convicção de que apesar de tudo isto sempre vence que respira momentos bonitos de ser, momentos maravilhosos de dar a sentir, descobertas de viver com beleza na alma e no coração, tu és assim !
Aqui não está uma fotografia tua, mas já vivi algumas, desde alguns anos, conheço a beleza do teu rosto, o calor doce e o brilho dos teus olhinhos, a delicadeza e ternura dos gestos dos teus lábios, as tuas posturas, os teus dizeres, a janela dos teus sentimentos, o mundo a preto e branco de outros tempos já deu lugar ao mundo de belas cores de ti, eu nunca te menti, Ari, linda rapariga, linda vizinha (eu estou relativamente perto, em Oeiras.), sem te aperceberes disso, tu és professora na beleza do sentir !
Very Goodwork !
(beijinho !)

tempus fugit à pressa disse...

geralmente sempre foi uma questão de proximidade ama-se o que se pensa conhecer
não se ama o que é estranho a nós pelo menos não durante muito tempo

ama-se a monotonia porque esta dá segurança
amar o perigo e a insegurança...é ou viver no ciúme, ou não amar a pessoa mas apenas as características que a relação proporciona

o amor é tédio
a paixão é aventura,é o desconhecido

tempus fugit à pressa disse...

O homem que está em condições de dominar arlguém
compreendeu o outro
mas não é livre consigo próprio
necessita de dominar
porque não se consegue aceitar